A conquista é fruto da atuação do Comitê de Diversidade do Poder Judiciário
A Corregedoria Geral de Justiça do Maranhão atualizou as regras para mudança do nome de transgêneros, desburocratizando o acesso ao nome social. A conquista é fruto da atuação do Comitê de Diversidade do Poder Judiciário, composto pelo Coletivo Nós (PT), Tribunal de Justiça, Ministério Público, Secretaria de Direitos Humanos e Participação Popular, e representantes dos registradores e da comunidade LGBTQIA+.
Agora, pessoas trans, maiores de 18 anos, poderão requerer pessoalmente a alteração e averbação do prenome e do gênero no registro de nascimento ou casamento, a fim de adequar o documento à identidade declarada. Este requerimento poderá ser realizado em qualquer ofício de Registro Civil das Pessoas Naturais (RCPN) diverso ou diretamente no ofício onde o assento se encontra lavrado, e deverá ser assinado pela pessoa interessada na presença do registrador, indicando a alteração e fazendo a conferência dos documentos pessoais originais.
“O nome social faz com que as pessoas transgêneros e travestis tenham mais inclusão e se sintam mais acolhidas, pois isso nada mais é que respeitar sua dignidade, a sua própria vida, a sua personalidade”, explicou o co-vereador do Coletivo Nós, Jhonatan Soares. A alteração do registro de nascimento poderá abranger a inclusão ou a exclusão de nomes indicativos de gênero ou de descendência, mas não poderá modificar os nomes de família, nem resultar na mesma identidade de prenome com outro membro da família.
Segundo o co-vereador, esta conquista é resultado da luta da comunidade LGBTQIA+. “O nome social é um direito, que inclusive foi decretado pela presidenta Dilma Rousseff em 2018. O Maranhão já permitia a efetivação desse direito, porém existia muita burocracia e outras questões que acabavam dificultando com que as pessoas o acessassem. O Coletivo Nós foi procurado por militantes e ativistas do movimento LGBTQIA+ e entendemos que esta é uma pauta importante para a garantia da efetivação dos direitos das pessoas, tornando-se uma prioridade do nosso mandato facilitar este acesso ao nome social”, completou.
Documentação
A mudança poderá ser feita sem autorização judicial, comprovação de realização de cirurgia de transgenitalização ou de tratamentos hormonais ou patologizantes, ou de apresentação de laudo médico ou psicológico. Caso a pessoa interessada não tenha condições financeiras de pagar os emolumentos (taxas cartorárias) do procedimento de alteração, poderá preencher a declaração de hipossuficiência (pobreza), com formulário eletrônico editável disponível na página da Corregedoria Geral da Justiça e do Comitê de Diversidade na internet, e entregar diretamente no cartório.
A pessoa interessada deverá se dirigir ao cartório munida de original e cópia dos seguintes documentos: Certidão de nascimento ou de casamento atualizada; Carteira de identidade ou documento equivalente; CPF; Título de Eleitor; Comprovante de Residência. Além dos comprovantes de certidões negativas dos últimos cinco anos de: Certidão de distribuição cível (estadual e federal); Certidão de distribuição criminal; Certidão de execução criminal (estadual e federal); Certidão da Justiça Eleitoral; Certidão da Justiça do Trabalho; Certidão dos tabelionatos de protestos; e Certidão da Justiça Militar, se for o caso. Outros documentos que podem ser apresentados, se houverem, são: Carteira de identidade social e Passaporte brasileiro.
Além desses documentos, é permitido à pessoa requerente juntar ao requerimento, para instrução do procedimento, os seguintes documentos: laudo médico que ateste a transexualidade/travestilidade; parecer psicológico que ateste a transexualidade/travestilidade; laudo médico que ateste a realização de cirurgia de redesignação de sexo. A falta de qualquer um dos documentos impede a averbação da alteração pretendida. No entanto, a existência de ações judiciais em andamento ou débitos pendentes indicados nas certidões não impedem a averbação, que deverá ser comunicada aos órgãos competentes pelo cartório responsável pela alteração.
Direitos garantidos
A atualização da norma foi feita pelo desembargador Paulo Velten, corregedor-geral da Justiça, no Provimento – 30/2021, de 16 de julho, que regulamenta esse procedimento e cancela os provimentos anteriores sobre o assunto (Provimentos 17/2018, 30/2018 e 1/2021).
O Provimento da Corregedoria Nacional de Justiça dispôs sobre a averbação da alteração do prenome e do gênero nos assentos de nascimento e casamento de pessoa transgênero no Registro Civil das Pessoas Naturais. Também cumpre Resolução nº 348/2020, do Conselho Nacional de Justiça, que utiliza o glossário adotado pelas Nações Unidas no movimento Livres e Iguais, na uniformização e definição dos termos referentes à população LGBTQIA+ e conceitos de orientação sexual e identidade de gênero, comportando a aplicação para os atos de registro civil.
“A elaboração de novo provimento pela CGJ-MA foi construído de forma coletiva pelo Grupo de Trabalho do Comitê de Diversidade do Poder Judiciário, iniciado no dia 11 de março deste ano. Estivemos nesta articulação desde o início, participando das reuniões de trabalho e com o Núcleo de Aprimoramento do Extrajudicial (NAE), e colaborando na modificação do texto das resoluções que antes dificultavam o acesso ao nome social”, ressaltou Jhonatan Soares.
Lohanna Pausini, secretária de Comunicação e Articulação Política da Associação Maranhense de Travestis e Transexuais (AMATRA) e vice-presidente do Instituto Raíssa Mendonça, destacou que o direito da retificação do nome social por toda pessoa trans é mais do que um simples documento com alteração de nome ou
gênero. “Esta é uma conquista de direitos humanos que valoriza o ser humano, seja ele homem ou mulher. É uma questão de legitimação que a Justiça nos concede diante da sociedade. Eu ser respeitada por Lei como uma mulher trans, por exemplo, me assegura legalmente que espaços femininos me pertencem. Os conceitos e valores pessoais de cada indivíduo precisam estar resguardados pela força coercitiva da Lei. Então é isso que a retificação do nome social vem trazer, não é um simples papel com o qual eu troco de nome, por trás dele tem toda essa simbologia e empoderamento”.
Ela parabenizou a iniciativa da Corregedoria atendendo uma solicitação feita pelo Coletivo Nós. “É preciso que as Corregedorias de Justiça de todos os Estados brasileiros entendam a importância de desburocratizar o acesso a este serviço, a exemplo do que o Maranhão está fazendo, pois aqui antes era algo quase inalcançável, com a exigência de muitos documentos. Espero que esse direito de fato seja executado na prática e seguido por outros Estados para que possamos cada vez mais levar esse benefício para quem precisa, valorizando e respeitando a pessoa trans”.